Quem salvará a democracia?
Carlos Lúcio Gontijo
Observamos com muita preocupação a dificuldade de acesso da população brasileira a uma saúde pública de qualidade. Nada mais aflitivo e deprimente para os cidadãos integrantes das camadas mais pobres que a não obtenção de atendimento médico na hora em que enfrentam problemas de saúde, pois é o vigor físico-orgânico a única coisa de que dispõem para enfrentar a luta pela vida. Afinal, os trabalhadores mal remunerados não ostentam poder aquisitivo para contratar seguridade alguma, a não ser os serviços públicos gratuitos que lhe são (ou deveriam ser) oferecidos pelo governo.
Indubitavelmente, não existe lição maior de desapreço pela vida do que a experiência de assistir a pai, mãe, filho ou amigo perder a vida por absoluta falta de atendimento médico. Há um vazio de sensibilidade cristã na gestão pública brasileira, onde o administrador legalmente constituído se recusa a exercer sua atividade com esmero, probidade e profundo sentimento coletivo.
Acreditávamos que o presidente Lula, originário das classes desprivilegiadas do estrato social e que passou pelo dissabor de perder a primeira esposa em trabalho de parto, segundo ele por aparente intervenção médica distante dos cuidados terapêuticos exigidos, fosse tomar a saúde como um dos pilares de sua passagem pela Presidência do Brasil. Todavia, essa expectativa não se confirmou e a saúde pública permanece enferma, padecendo de todos os males do desleixo e da indiferença em relação ao sofrimento dos que só contam com a mão do Estado na hora da doença.
A população brasileira se encontra insatisfeita com o tamanho do descaso explícito no tocante à administração pública e não é à toa, pois a velha desculpa da falta de recursos não mais cabe, uma vez que os escândalos de corrupção e casos de propina espocam país afora, numa eterna noite de São João, em que acontece a famosa dança das quadrilhas. Calculam os analistas econômicos que a malversação de verbas públicas e contratos superfaturados surrupiam dos cofres nacionais cerca de 200 bilhões de reais/ano.
A triste realidade é que nossas autoridades andam confundindo democracia com total permissividade, onde é proibido proibir e o que se leva em conta é a liberdade individual, ainda que à custa da morte ou aniquilamento de todo e qualquer interesse coletivo. E em ambiente assim esboçado, a violência encontrou o nicho perfeito para a sua eclosão hoje refletida em todos os índices estatísticos e coletas de dados: 45 mil assassinatos e 20 mil mortos nas estradas todos os anos. Ou seja, vivemos uma verdadeira guerra travada sob os símbolos da paz, do carnaval, da religiosidade e da decantada glória da convivência miscigenada.
A completa falta de mobilização da sociedade brasileira, a inércia dos governantes e o generalizado medo paralisante diante de agressores e malfeitores confessos (e impunes), que decretaram a pena de morte para os cordeiros que aceitam a imolação iminente feito gado conduzido ao corte, sentenciam o fim da chamada sociedade ordeira – que pela ordem não luta e se nos apresenta incapaz de salvar os ideais de democracia e liberdade assentados em deveres e não apenas em direitos.
Carlos Lúcio Gontijo
Poeta, escritor e jornalista
Da Academia de Letras do Brasil-Mariana (ALB-Mariana)
www.carlosluciogontijo.jor.br
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